30 de junho de 2010

Professor Emilião, uma visita



Ontem fiz uma visitinha ao nosso querido professor Emilião.

Quarto 529 (e não 523, como informado anteriormente) do Hospital Mãe de Deus, Porto Alegre. E lá estava ele, deitado na cama e já bem velhinho, mas ainda cheio de vigor e coisas para contar. Conversamos por mais de 40 minutos, ao longo dos quais, infelizmente, o bom velhinho não conseguiu recordar quem diabos era aquele tal de "Pegorini", ou "Ricardo Lisboa Pegorini", que ali estava o visitando. Claro que não fiquei magoado com isso. Imagine, recordar o rosto de cada um dos milhares de alunos que assistiram suas aulas nestes 55 anos de magistério seria uma tarefa impossível de exigir até mesmo do nosso Super-Emilião. Ainda mais lembrar de mim 30 anos depois e 40 kg mais gordo ... talvez nem eu mesmo me reconhecesse se não tivesse acompanhado pessoalmente como estes acréscimos foram sendo incorporados ao corpo esquelético que eu tinha nos anos 70.

Do alto dos seus 76 anos, o velho mestre ainda tem lembranças de quando chegou a Porto Alegre, de quais turmas foi professor no Rosário, nas Dores e mais um outro colégio que eu não lembro agora. Contou-me tranquilamente, com aquele ar de vitorioso na vida, como foi perdendo vinte dos seus 116 quilos desde que veio de Cerro Largo para fazer exames na capital, depois de ver a pressão chegar a preocupantes 20 por 9 (!!!), graças à comida frugal do hospital e aos novos cuidados com a saúde que a vida começa a lhe exigir. E desse quadro meio patológico ele consegue fazer o link para uma lembrança positiva, de quando uma vez percorreu numa tarde, a pé, a beira da praia entre Cidreira e Tramandaí, e que para provar ao Irmão Lauro a peripécia, deixou uma nota de 5 cruzeiros na plataforma de Tramandaí. E que percorria diariamente 6 km em uma hora, já que o perímetro da quadra de futebol de salão somava 100m e ... e olha aí .... estamos fazendo cálculos novamente ... hehehe .. o velhinho não toma jeito mesmo.


E me falou que se considera um homem vencedor, mas não realizado. Algo que não consegui entender na hora, e talvez nunca consiga entender como um homem desses, amado por gerações e mais gerações de alunos, não consegue ainda sentir que tenha já cumprido uma fabulosa missão de vida, de ensino, de hombridade e de dignidade. Talvez seja a eterna insatisfação do ser humano. Talvez seja essa nossa teimosia de nunca desistir, talvez seja a nossa inquebrantável vontade de dizer: "não, não agora .. tenho coisas a fazer ainda antes de entregar os pontos".

Mas a minha parte eu fiz. Não queria deixar esse homem morrer sem saber que ele fez diferença na minha vida, que as conversas nos corredores do colégio foram, finalmente, ouvidas e entendidas. Que eu sou uma pessoa melhor do que era na época graças, claro, às pessoas que se importaram comigo, meus avós, meus amigos, e àquele professor de matemática que me ensinou muito mais do que fazer contas.


Grande abraço dorense
Ricardo


O Professor José Inácio Rieckziegel ficará no Hospítal Mãe de Deus (na Av. José de Alencar), no quarto 529, até sexta-feira, dia 02/07. Se você também tem alguma coisa do seu coração a dizer pessoalmente ao velho mestre, não deixe pra depois.